terça-feira, 13 de novembro de 2012

Sempre disse a mim mesma que ter cancro hoje é dia é coisa comum. Sabe-se lá "o que anda na água que bebemos", se é o sol que está mais forte, se havia o mesmo número de casos e simplesmente passavam como doença desconhecida, o que for. Na minha cabeça, uma em cada 10 pessoas, 15 vá, uma tem cancro, por isso não seria de estranhar que a doença me batesse à porta. (Vamos é sempre esperando que seja à porta dos outros.) Tive então de enfrentar o choque inicial do "a minha mãe tem cancro" e com isso vieram as perguntas sem resposta, as guerras com Deus, o abalar do acreditar em que o bem atrai o bem. A minha mãe? Mas porquê a minha mãe? Sei que não é uma mulher perfeita e ainda hoje a culpo por ser tão boa a fazer aquela chantagenzinha emocional de mãe para filha, que me fez não comprar o vestido de noiva que eu queria e outras coisas do género. Mas isso são coisas entre nós, porque o que eu conheço da minha mãe em sociedade é de estar sempre pronta para ajudar. Consigo perder-me na conta das pessoas que ajudou. A minha mãe é daquelas que não consegue passar sem dar uma esmola a quem a pedir. Já lhe disse que nunca poderia viver em Lisboa, senão gastava o dinheiro todo em pedintes. Não que isso fosse uma coisa má, porque há quem precise mesmo e o nosso egoísmo fala mais alto. É claro que é melhor comprar um par de botas novo, do que ir dar um saco de ração a um canil de animais abandonados. Estou a desviar-me do assunto. Voltando à questão, a minha mãe porquê? Se sempre a vi a fazer o bem? Se sempre trabalhou para ter o que tem? Se já passou por tanta coisa e teve sempre de dar a volta por cima. Não tinha já tido a sua dose de problemas? Porque é que teve mais este?
Nesta altura andei assim mais pó filosófica. A razão de existirmos tornou-se numa grande incógnita. Acreditei piamente naquela expressão, que agora não me lembro bem, mas é algo do género somos marionetas nas mãos de Deus, coisas com que pode brincar e depois tira a vida quando lhe apetece. Quando falei disto com o Zé ele até veio com aquela história do "não és feliz", como se fosse um coitadinho de um acessório que ali andava. Como explicar-lhe que não tinha nada a ver? Que simplesmente estava a passar por um susto que me estava a fazer ver a vida sob outra perspectiva, sob o olhar clínico de que somos bichos que vamos morrer a qualquer instante, sabe-se lá como, mas que nos vamos entretendo com coisas como o amor e a felicidade para esquecer a verdade. Verdade essa que é, ninguém dura para sempre. Bem (e um suspiro aqui), não vamos falar de coisas déprê que estou a fugir ao assunto de novo.
Passado o choque inicial, a minha mãe começou a arrebitar psicologicamente (e a definhar fisicamente com os tratamentos, mas isso não interessava nada), e nunca me passou pela cabeça que fosse correr mal. Aliás, como pessoa egoísta que sou, tinha mais era que ficar boa porque ainda ME fazia muita falta. Ninguém nesta casa conseguiria viver sem ela. E eis que os tratamentos termiram ao fim de 11/12 semanas e fizemos a temida pergunta "e agora?" E agora, disse o médico, em principio está resolvido. Continuou a falar do voltar à normalidade e outras recomendações e eu já nem ouvia. Na minha cabeça pensava: só isto? Resolveu-se em poucos meses? Está tratada? Eis que foi a mãozinha do karma que entrou aqui. Não podia uma mulher andar a fazer coisas boas aos outros a vida toda para depois ter de sofrer aos milhões. Conseguiu passar por tudo sem nunca tirar os saltos altos! Voltei a acreditar no máxima do what goes around comes around. Quando dás coisas boas, recebes coisas boas, mesmo que disfarçadas em doença. Podia ser uma coisa muito pior, um cancro da mama que é tão mais desgastante para a mulher. Não foi e agora podemos dizer que sobrevivemos ao cancro "com uma perna às costas"!
É claro que ainda não é para deitar foguetes, é mais para andar em pézinhos de lã, mas que seja sobre uma carpete vermelha em direcção à vitória!

2 Comments:

  1. jonah said...
    queria deixar-te um beijinho muito grande! este texto tocou-me muito e só espero que continue tudo a correr da melhor maneira possível. (e sim, também acho que what goes around, comes around) :)
    Maria Bem Me Quer said...
    Deixo-te o abraço mais apertado do mundo. E continua com essa força, porque é isso mesmo que nos faz caminhar para a frente. Um beijo enorme para a tua mãe, super especial também, e pelo facto de também ter uma filha como tu! Muita força e tudo vai correr bem!

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