domingo, 26 de agosto de 2007

Vaidosices


Quando comecei a sair à noite, por volta dos 17/18 anos (nada como as miúdas de agora que aos 15 já estão na discoteca até às 5 da matina), demorava horas a arranjar-me, a maquilhar-me, a pintar as unhas da cor da camisola que ia vestir, a tentar domar o meu cabelo, que na altura era muito encaracolado, e, segundo consta, era olhada de lado por isso. Se estivesse no Porto, onde as mulheres se produzem a sério quando saem à noite, passava despercebida, mas ali, na santa terrinha, aquilo era sinal de vaidade, de exibicionismo. Não sei porquê. Ao olhar para as fotografias da altura até acho que estava simpleszinha, usava roupa do mais normal que havia, sempre calças e camisolas, no verão lá ia um vestinho de vez em quando porque odiava as minhas pernas, os meus canivetes como o meu pai as chama, mas compensava com a barriga que estava sempre à mostra. Com o tempo fui mudando. Ainda me arranjo bastante para sair, mas se me apetece ir de chinelos e cara lavada vou, não faço disso uma tragédia. Se quando era mais nova me maquilhava sempre que saía de casa e pintava as unhas todos os dias, agora dou graças aos deuses do Olimpo nos dias em que não tenho de o fazer. Uma coisa é gostar, a outra é ser obrigada. Desde que o trabalho que forçou a ter de fazer essas coisas, que perdeu a graça inventar formas para pintar os olhos, misturar sombras, pintar-me toda de uma certa forma só para ver como ficava e depois lavar a cara e ir dormir. Troquei os saltos pelas sapatilhas e pelos chinelos de enfiar no dedo, deixei de esticar o cabelo e deixei que o ondulado reaparecesse, solto e rebelde ou apanhado num rabo de cavalo. As calças vincadas que não largava passaram a calças de ganga, os tops que mostravam a barriga a camisolas à grávida. De mais ou menos sofisticada passei a descontraída.
Mas ela não, ela não desceu do salto. Cruzei-me com ela na esteticista no outro dia e partilhámos um “bom dia” educado. Comecei logo a tremer e escondi-me atrás de um expositor da Clinique onde fingi ver os batons. Só pensava “se ela sabe que estive com ele ontem, se ela imagina que ele ainda agora me telefonou, mata-me! Vai chegar ao pé de mim e dar-me uma bofetada, vai puxar-me o cabelo e dar-me pontapés, vai chamar-me nomes, gritar para toda a gente ouvir. E eu não vou fazer nada, vou encolher-me e esperar que passe. Ela tem razão: eu sou a culpada.” Pensava nisto, imaginava o filme e olhava para ela pelo canto do olho – as sandálias de plataforma, a camisola de marca, o penteado da moda, a cara perfeitamente maquilhada com uma sombra escura nos olhos como sempre – e olhava para mim, vestida como se fosse para a praia, com um par de havaianas nos pés, o cabelo despenteado, as olheiras de quem dormiu mal. Faltou pouco para me sentar num canto e me encolher, enroladinha para que não me visse. O que vale é que ainda tenho alguma coragem e cara de pau que me deixou andar ali, de olhar perdido e nariz empinado. Nesse dia tive pena de não ser tão vaidosa como há alguns anos. Podia estar melhor arranjada, caramba!

5 Comments:

  1. Miuda Stressada said...
    Leio o teu blog ha muito tempo e ate agora nunca fiz grandes comentarios sobre este tema porque nao quero ser injusta e muito menos julgar alguem que nao conheço. Espero que nao te ofendas com as minhas palavras, é so uma opiniao pessoal, mas como decides partilhar os teus problemas connosco acho que estás obviamente à espera de algum feedback. Portanto aqui vai:

    relativamente a certos aspectos, parece que quanto mais leio menos percebo. Sinceramente, há alguma razao valida no mundo para andar tantos anos com alguem que tem outra?? Um homem que anda com duas mulheres ao mesmo tempo nao pode gostar verdadeiramente de nenhuma, so pode é estar a gozar com a vossa cara! E a tal "namorada oficial", afinal ela sabe que tu existes ou pelo menos suspeita? E nao faz nada? Ainda está com ele?

    Ja muitas pessoas tentaram dizer-te isto de uma maneira mais suave, mas eu sou assim um bocado mais bruta...Mas tu és masoquista ou quê? Que tal esqueceres de vez quem te magoa e partires para outra? Eu sei que é facil falar e que so quem está nessa situação é que sabe o que custa, mas às vezes parece que estás tao habituada a sofrer que preferes acomodar-te a essa situação em vez de lutares para ser feliz.

    bj*
    P said...
    Olá Miúda Stressada,
    não te preocupes com essa maneira bruta de me abrir os olhos, porque muitos o fazem na minha vida pessoal. E garanto-te que só falta baterem-me. Muitas vezes já nem falo deste caso porque sei que é uma desilusão para eles, para mim já é vergonha. Felizmente já vejo a luz no fim do túnel, está mesmo a acabar. Provavelmente é esta semana, hoje ou amanhã. Já não há nada a fazer, nem a esperar.
    De qualquer forma, obrigada pelo comentário. Faz sempre bem ouvir mais uma pessoa dizer-me mais uma vez que não vale a pena. E não vale.
    Beijo,
    P
    m said...
    apesar de pensarmos que não,há histórias das quais nos conseguimos desprender.com tempo, com vontade.quando tem de ser.


    e olha (esta tenho de dizer), tu és muitooooo,muitoooo bonita.
    Miuda Stressada said...
    Enfim,para teu bem espero mesmo que esteja a acabar.

    força aí.

    bj
    Francisco o Pensador said...
    P, esse teu comportamento não terá algo a ver com uma necessidade ,que te invadiu em determinada altura da tua vida,e te fez sentir que "não prestas" ou que "não mereces ser feliz"?
    Não quero invadir a tua privacidade e garanto-te que não te conheço de lado nenhum,mas aconteceu algo na tua infância,adolescência ou na vida adulta que explique esse teu comportamento?

    Sinto que estás plenamente consciente que estás a ser usada,mas que precisas dessa sensação para conseguires viver.

    Estou errado?

    Abs.

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